Archive | March 2021

Março, mês da mulher

Mês de março está terminando. Eu achei que não ia escrever nada esse ano. Foi quase. Estou terminando o mês com um sentimento alto de frustração. Essa semana passei por duas situações de preconceito no trabalho que me frustraram muito.

Mas eu não quero falar sobre as minhas situações. Eu quero falar sobre o contexto em que elas acontecem, o quanto afetam o desenvolvimento profissional de quem sofre e de quem pratica o preconceito.

Tenho escrito artigos focados no mercado de trabalho e, nesse mês da mulher, pensando nas situações problema que eu passo ou ouço outras pessoas passarem, decidi escrever aqui.

Primeiro: eu presencio e sofro preconceito de diversos tipos, não só por ser mulher. São situações diversas que envolvem raça, conhecimento técnico, sexualidade, posição de poder na hierarquia.

Eu também sofro preconceito devido ao fato de ter me afastado da raiz técnica da minha profissão e ter seguido o caminho de gestão. Sim, eu sei por relatos que algumas pessoas não me veem com respeito porque eu deixei de ser desenvolvedora e trilhei a carreira na área de negócios. Hoje sou Gerente de Produtos. Alias, essa pessoa nunca conversou comigo e perguntou sobre meu passado e acredito que nem saiba do meu conhecimento técnico.

Eu já presenciei inúmeras situações onde eu percebi que uma pessoa negra era avaliada com grau de exigência maior do que uma pessoa branca. Ou uma mulher que desejava seguir a área técnica sendo empurrada para a área de gestão de negócios. Ou um PCD que é sempre considerado alguém que precisa ser capacitado.

Uma pesquisa no Linkedin apontou que a mulher só se candidata para uma vaga se ela possui 100% dos requisitos, enquanto que um homem se candidata mesmo tendo um percentual bem menor. Isso demonstra um ciclo vicioso no mercado, e, agora vou focar somente no caso da mulher:

  • A mulher sente que não pode estar aquém das exigências
  • A mulher é intimidada em inúmeras situações para estar completamente correta e saber tudo de cor
  • Isso leva a mulher a estudar com muita dedicação e completamente todos os assuntos da sua profissão
  • Quando ela se candidata a uma vaga, geralmente ela é uma das mais preparadas e consegue a vaga
  • No time em que ela vai trabalhar, todos sabem que ela tem todos os requisitos da vaga
  • Isso intimida os homens que não tem todo o conhecimento que ela tem
  • Esses homens, inconscientemente, criam cenários de intimidação dessa mulher que fazem com que ela tenha dificuldade de colocar sua opinião nas mais diversas situações

Quando uma mulher, que vive esse cenário, percebe-se numa situação de preconceito, muitas vezes o seu primeiro pensamento é de que está exagerando e de que não é uma situação de preconceito. Se ela insiste e leva a questão a um líder, existe a possibilidade do líder também achar que é exagero. Afinal, se eles tivessem preconceito contra mulheres ela nem estaria ali, não?

Pois é. Nem sempre. E isso demonstra, na minha opinião, o machismo estrutural. Muitos homens não sabem lidar com uma mulher em uma mesa de reunião. E adotam uma postura condescendente ou dominadora. Sinceramente, não sei qual é a pior.

Eu vou terminar esse post sem opiniões, mas com muitos exemplos de situações que eu já vivi ou que alguém próximo a mim já viveu. São muitas e espero lembrar das mais significativas. Sei que muitas pessoas se identificarão e eu sinto uma tristeza profunda em saber disso. Se você ler e se identificar me conta, por favor?

Eu gostaria muito de ajudar a resolver, não todo o problema do machismo estrutural porque acho que é um trabalho gigantesco que não conseguirei sozinha, mas alguns pequenos comportamentos que, em alguns anos, podem ter um impacto gigante nas novas gerações. Vou me permitir postergar para outro momento sobre falar de ações que eu já faço para tentar mudar a situação para mim e para as mulheres que também convivem com essas situações.

  • Para expor uma opinião, tenho que estar extremamente preparada com muitos argumentos, contra-argumentos, exemplos. Se tiver algum homem que possa me apoiar, facilita muito.
  • Sou constantemente interrompida nas reuniões quando estou falando, antes de eu terminar de expor minha ideia.
  • Quando coloco a minha opinião, ela é recebida com um comentário “fofo” que muda totalmente o assunto do grupo.
  • Quando coloco a minha opinião, ouço coisas tipo “acho melhor não”. Parece que ouviram o que eu disse, mas não ouviram.
  • E na semana seguinte, ou até mesmo alguns poucos minutos depois, um homem fala exatamente o que eu disse e é ovacionado.
  • Sou criticada por não participar das reuniões.
  • Eu procuro minha liderança sobre uma situação tóxica no time e me dizem que é coisa da minha cabeça.
  • Eu sou conhecida como referência em um assunto, mas ninguém me procura para pedir ajuda sobre o tema que eu domino.
  • Sou criticada por ser grossa ou ter uma postura muito masculinizada (impositiva, firme, objetiva).
  • Sou criticada por ser muito emotiva.
  • Sou criticada por falar de forma muito suave ou que meu tom de voz é muito baixo.
  • Sou criticada pela forma como me visto.
  • Sou criticada por não almoçar todos os dias com o time.
  • Sou criticada por não ter agenda disponível.
  • Sou criticada por não sair no horário pois tenho que buscar meu filho na escola.
  • Sou criticada por ser solteira.
  • Sou criticada por ser casada e não estar disponível para viagem a qualquer momento.
  • Já recusei uma oferta de participar de um grupo de ação contra preconceito porque senti que era para cumprir uma meta corporativa, mas não tinha real intenção de mudar a situação.
  • Aviso por dias que uma determinada ação precisa ser executada ou uma crise pode acontecer e não recebo atenção até que eu envolvo na situação um homem, geralmente numa escala de poder superior a minha.
  • Preciso pensar muito antes de levar um feedback sobre um homem que me tratou com preconceito, polindo as palavras e tirando do discurso qualquer menção à questão do machismo, porque se o machismo surgir na conversa, meu feedback perde a validade.
  • Sou alvo de piadas machistas nos corredores, café ou reuniões.
  • Recebo feedback de que me posiciono muito bem perante ao cliente, mas quando estou trazendo um relato sobre o ambiente de preconceito, ouço que tenho dificuldades em me expressar.
  • Já me questionei se a minha roupa, maquiagem ou corte de cabelo influenciou uma decisão de promoção.
  • Já me questionei se minha idade influenciou uma decisão de promoção.
  • Já me questionei se a minha postura estava inadequada porque não fui ouvida em uma reunião.
  • Já inventei uma desculpa para não participar de uma reunião que eu senti que seria tóxica para mim.

Aprendizados da pandemia que eu aprendi antes dela

Estamos passando por momentos bem desafiadores, é fato. E tenho visto em várias redes sociais pessoas publicando aprendizados da pandemia. Hoje vi um que me chamou a atenção pq a maioria dos itens eu já tinha descoberto há muito tempo na minha vida.

Fato 1: ter mais coisas do que se precisa

Quando eu descobri isso, mudei a forma como compro e mantenho as coisas. Parei de guardar coisas que nunca vou usar mas podem ser uteis para alguém. O número de peças de roupa que eu tenho agora é mínimo. Se compro uma peça nova, outra obrigatoriamente vai para doação.

Eu tenho poucos eletrônicos. TV, por exemplo, eu comprei só após mais de quatro anos morando na minha casa. E porque comecei a sentir a necessidade de assistir TV enquanto escrevo ou me comunico no computador.

Fato 2: trabalhar de casa é bom

Sim, desde um ano antes da pandemia eu já trabalhava de casa uma vez na semana. E é ótimo. Existem prós e contras em todos os cenários, claro, e eu já estava planejando de aumentar o número de dias de trabalho em casa. Além de economizar o tempo de traslado, tem a vantagem de conseguir organizar meu tempo de um jeito diferente. E, as vezes, o tempo rende mais.

Fato 3: comida caseira é maravilhosa

Pois é. As pessoas esqueceram disso. Já há alguns anos que eu tenho preparado minha própria comida, em casa, e levado marmita pro trabalho. Não gosto muito de comida requentada, mas era o melhor que eu conseguia. Trabalhando de casa cozinho todos os dias. Comida de verdade e fresca.

Fato 4: tempo de traslado é desperdício

Você pode até pagar mais caro pela moradia, mas morar perto do trabalho é uma experiência maravilhosa. Há anos que eu moro a 15 minutos do trabalho. E isso é realmente impagável. A pandemia não impactou meu tempo de traslado porque eu já gastava muito pouco tempo. E o tempo que eu economizo no traslado eu redireciono para estudar, fazer exercícios e até preparar minhas refeições.

Quando eu não tinha essa opção, eu lia ou ouvia áudios no traslado para que o tempo fosse melhor aproveitado.

Fato 5: comprar pela internet é muito prático

Compro minhas coisas pela internet desde o ano de 2000, quando o Submarino.com.br foi lançado. Eu comprava livros, CDs e DVDs. Já comprei de tudo na internet, de roupas a eletrônicos. Se você pode esperar pelo tempo de transporte, é a melhor opção. Muitos sites oferecem frete gratuito e agora já existem centros de distribuição que permitem a entrega no dia seguinte ao da compra.

Fato 6: dormir horas suficientes todas as noites

Eu costumo dormir cedo e não preciso de muitas horas de sono há anos. Seis a sete horas são suficientes pra mim. Em geral, se o sol nasce, eu desperto, então procuro dormir antes das 23h. Cada pessoa tem o seu ciclo de sono e é importante entender a necessidade do seu corpo e respeitá-la.

Acho fantástico que algumas pessoas tiveram esses insights por conta da pandemia. Acredito que eu não senti tanta diferença na minha rotina na pandemia justamente porque eu já tive esses aprendizados antes e já havia mudado muita coisa da minha rotina e valores.

Tempo e auto-conhecimento

Essa semana participei de uma situação muito inusitada no LinkedIn. E isso me fez pensar em como eu mudei após dez anos de terapia, auto-conhecimento e busca pelas minhas metas de ser uma pessoa melhor.

A situação foi a seguinte: eu decidi estar mais ativa no LinkedIn e comecei a ver muitas postagens de pessoas, desempregadas, contando suas estórias e pedindo ajuda para encontrar um emprego. Algumas estão procurando por uma vaga há mais de dois anos. Outras, perderam seus empregos recentemente. Outras, jovens, estão em busca do seu primeiro emprego.

Eu decidi que deveria ajudar de alguma forma. E, no sábado, a primeira postagem que apareceu na minha timeline eu comentei oferecendo ajuda. Era uma pessoa com formação em tecnologia, o que é ótimo pois é onde eu atuo mais fortemente há 20 anos. Conheço muitas empresas na área e poderia ajudá-la a encontrar algo.

Não vou mencionar o nome da pessoa, nem postar cópia das mensagens, pois não é este o foco desse post.

O ponto é que, ao longo da semana, outras pessoas começaram a clonar o post original, fazendo poucas modificações, como se fosse um “modelo de post”. O autor original se sentiu bastante agredido e começou a ameaçar todos os copiadores de denúncia na ferramenta.

A um certo ponto, uma pessoa resolveu ajudar de forma mais efetiva e fez um post interessante informando as pessoas que não é bem aceito o plágio, orientando essas pessoas a escrever seus próprios textos. Prontamente comentei concordando.

Aqui o inusitado aconteceu: o autor original do post de ajuda ficou irritado com meus comentários e enviou uma mensagem questionando a ética de quem estava copiando.

Foi aí que eu percebi uma coisa em mim: eu procuro usar o olhar de entender o que está por tras das mensagens.

Quando eu comecei a ver todos aqueles posts-clone, a primeira coisa que passou pela minha mente foi o quanto aquelas pessoas perceberam o quão boa era a ideia, mas, ao mesmo tempo, sem criatividade e escrever seu próprio texto, se apropriaram do texto original. Sim, faltou criatividade. Mas também sobrou a inocência de que vivemos em uma era onde as pessoas não acham que é um problema copiar as ideias boas. Também vivemos em uma era onde o tempo vale dinheiro. Una-se a isso tudo a inocência de acreditar que as mesmas pessoas não veriam os posts, afinal, somos inundados com posts o dia todo.

E meu segundo pensamento foi sobre como essas pessoas estão desesperadas por um emprego. O terceiro pensamento foi sobre como eu poderia ajuda-las.

Em um comentário posterior, a pessoa enfurecida com os plágios comentou que isso é antiético e que se os pais não os ensinaram isso, que a vida irá lhes ensinar.

Esse ponto é interessante porque o que é a “vida que ensina” senão as outras pessoas que convivem conosco. As pessoas que nos mostram o certo e o errado através de exemplos, conselhos, ensinamentos. As pessoas que veem o que estamos fazendo bem, e o que não fazemos bem, e nos dizem isso através dos famosos feedbacks.

A “vida” não é uma entidade invisível. A vida são todas as pessoas que convivem conosco.

Eu acredito que a Vanessa de 20 anos atrás, nessa mesma situação, veria tudo de forma mais passional. Eu provavelmente ficaria irritada com alguém copiando minha ideia. Tirando meu status de ter tido a ideia.

Hoje eu vejo essa situação de forma muito diferente. Eu provavelmente estenderia minha mão, chamaria essas pessoas no privado e daria um feedback. Explicaria que essa não é a melhor maneira de chamar atenção para o seu problema e, talvez, até ajudaria a escrever seu próprio texto.

Essa, hoje, sou eu sendo a “vida ensinando a eles”.

Feliz aniversário: 1 ano de quarentena

Há exatamente 1 ano eu decidia trabalhar de casa. A empresa ainda não havia feito a recomendação, mas eu tomei a decisão, numa sexta-feira, de começar a trabalhar de casa na semana seguinte. Não havia completado duas semanas que eu tinha voltado de uma viagem aos EUA, onde eu fiquei por seis semanas. Por lá, aeroportos já estavam em caos com entrevistas e triagem de doentes – processo que iniciou no dia seguinte ao meu retorno para o Brasil.

No meio de março, já sabíamos do lockdown em Wuhan e do início de lockdown na Europa. E já tínhamos um caso confirmado em São Paulo. O escritório de Campinas decidiu simular trabalho de casa geral, colocando 90% das pessoas trabalhando de casa no dia 30/03. Ou seja, tinham 2 semanas para se preparar. Eu decidi começar meu movimento.

Já naquela época eu falava que ficaríamos em casa por, no mínimo, três meses. Muitos acharam que eu era exagerada.

Passei por crises de ansiedade e pânico. Tive medo de ficar doente sozinha. Tive medo de perder meus pais.

Continue reading